segunda-feira, 17 de abril de 2017

SÓTÃO DA MEMÓRIA




continuação

Vi desaparecer ao longo do tempo, muitos locais da minha infância, onde joguei à bola, como a Quinta Amarela nas Antas. Onde vi o circo como o Campo do Luso. Onde vi ciclismo como o Estádio do Lima. Salas onde mais tarde vi cinema, como o Central Cine da Carcereira, o Odeon em Pinto Bessa, o Vitória na Circunvalação, o Cine Foz junto ao castelo e ainda, o Águia D’ouro, Olímpia, Vale Formoso, Trindade, Carlos Alberto, Terço, Júlio Dinis e muitos outros.
Cafés que foram pontos de encontro na baixa portuense, autênticas tertúlias de amigos em tempo de liberdade proibida, como o Palladium onde se jogava ténis de mesa, bilhar, damas e até tinha barbearia. O Astória, sala de visitas para quem chegava ao Porto pela estação de S. Bento. O monumental café Imperial que é hoje a MacDonal’s (mudança directamente relacionada, com a perda de influência do Porto enquanto centro de negócios, se até bancos, companhias de seguros e outras instituições foram deslocadas para Lisboa!) O Rialto frequentado por Egito Gonçalves, Papiniano Carlos, Daniel Filipe, Rebordão Navarro. Na mesma Praça de D. João I, havia o Odin que veio para S. Brás e era o café dos salgueiristas, muitos, muitos cafés que faziam parte do património cultural desta cidade.            
Cafés que também tinham engraxadores (que ás vezes eram bufas) e tabacarias onde não se vendiam isqueiros a quem não tivesse licença. Era um Porto amordaçado, mas que a nossa imaginação não deixava morrer, como no café Cidade Nova em Costa Cabral, onde alguns amigos se juntavam depois de todos lerem o último livro da colecção “Vampiro” (sem as últimas 5 folhas), para adivinharem por dedução, o final do livro policial.  
Também existiu esplanada da “CUFP” que acabou (quando a fábrica da cerveja mudou para a Maia e é agora a UNICER), era ali junto à Praça da Galiza, onde se bebiam aquelas canecas gigantes de cerveja (as Girafas) e era muito frequentada pela malta que estudava como eu à noite, na escola industrial Infante D. Henrique.
Para os “Pregos em pão”, a malta tinha o café Pereira no Marquês. Para as Francesinhas, além da Regaleira (casa onde nasceram na década de 60 no Bonjardim), havia o Mucaba em Gaia e o café Portugal em Costa Cabral, que já não existem.
O Porto sempre foi especial na sua gastronomia, não se pode esquecer que foi nesta cidade que nasceram também o Bacalhau à Gomes Sá, criado pelo portuense José Luís Gomes de Sá Júnior falecido em 1926.      
E claro, temos as afamadas Tripas à Moda do Porto de onde herdamos o nome de “Tripeiros” desde que demos ao Infante todas as carcaças das reses para a campanha de Ceuta e só ficamos com as tripas para comer.
Mas voltando aos cafés antigos, mesmo os cafés que ainda resistem, como o Aviz, o Ceuta, o Progresso, o Estrela, ou ainda o Guarany, o Majestic e a (remodelados) A Brasileira que se foi… Ainda o Piolho, o Embaixador e outros, sentem imensas dificuldades, pois já pouca gente mora na cidade e ao fim da tarde, quando encerram todos os estabelecimentos, o Porto fica um deserto. Salva-se a “Movida” aos fins-de-semana.
Longe vai o tempo em que o Sérgio Godinho (que também nasceu no Porto) cantava: Ai, eu estive quase morto no deserto  /  E o Porto aqui tão perto...

continua            

 


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