segunda-feira, 28 de agosto de 2017

SÓTÃO DA MEMÓRIA




continuação

A noite tinha sido uma alegria, até o cansaço chegar. Nós, os mais espigadotes, tínhamos dado uma fugida até ao S. João do Paraíso, eu e o meu irmão, o Chico e o Cocas. Estalamos “Pirilampos”, deitamos “Bichas-de-rabear” mas tínhamos que fugir depois... A suar da correria, apesar das orvalhadas que caíam, íamos beber água à fonte de Salgueiros. O Chico nessa noite, perdeu o relógio “Cauny” que o pai lhe deu quando fez a quarta classe, chorava e adivinhava uma trepa das boas, tinha sido comprado a prestações à Ermelindinha. Resolvemos no dia seguinte, irmos todos falar ao Sr. Juvininho para que desculpasse o Chico.
Quando o Zeca da Amélinha gritou era manhã:

«Olha o Noticias! Traz o concurso das quadras!»

Levantei-me e acordei o meu irmão, deitei água do jarro na pia e lavei a cara, a água estava fria. O Cocas e o Chico já andavam na rua. Nessa Quarta-feira dia de S. João, fazia parte do programa das festas uma “Corrida de sacos” e “Partir os cântaros”. Para a corrida de sacos, estávamos todos inscritos, tínhamos até treinado, o Cocas opinava:

«Não estiquem o saco, deixem-no com folga para dobrarem melhor os joelhos ao saltar».

Alguns caíam, rebolando rua abaixo com os sacos já rotos, era uma pândega. O Zeca inscreveu-se para partir os cântaros barro, era o mais alto da malta. Os cântaros estavam pendurados por cordas e cheios de água, outros tinham farinha e só um tinha dinheiro que se espalhava ao partir. Era necessário não perder a noção do espaço e orientar o pau até tocar de leve, e depois desferir um golpe certeiro. Claro que a grande dificuldade, é que os olhos estavam vendados.
Nessa tarde de S. João, ainda houve uma corrida de arco e gancheta, que o Toninho da peixeira ganhou porque corria muito. Parece que ainda o vejo de número nas costas, a correr pela Lapa acima, dar a curva na Travessa de Salgueiros com o arco a saltitar no empedrado, entrar na rua da Gloria a travar na descida com a gancheta ao contrario, e cortar a meta junto ao tasco da Sãozinha, mesmo enfrente à minha porta.
Como era lindo o S. João da minha na rua... Estávamos em 1959 e eu só tinha 11 anos, e não acreditava se me dissessem, que um dia trocariam o alho-porro por um martelinho de plástico, que as Fontainhas iam quase acabar, juntamente com as festas dos bairros e das ruas... As rusgas? Só em concursos na baixa se voltariam a ver.

continua


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