continuação
O Carnaval era divertido, pelas
brincadeiras, pelas partidas que se faziam sem ninguém levar a mal. Com
bisnagas redondas em baklite, que cabiam na palma da mão, para molhar quem
passava. Os estalinhos com chumbinhos embrulhados em papel. Ampolas de
cheiro que ao partirem espalhavam um odor pestilento em redor. Haviam também os
pirilampos, umas tiras de cartão com fulminantes, que raspados na parede
estalavam no meio das mãos em
concha. Os chapéus coloridos de papel de crepe. Cornetas em
cone coloridas e as “Línguas da Sogra” que ao soprar, alem de assobiarem, se
distendiam com uma pena colorida na ponta e voltavam a enrolar impelidas por
uma mola. Haviam as máscaras de cartão com caretas medonhas e óculos com
grandes narizes e peludos bigodes, serpentinas e balões.
Nós, os mais mariolas, atávamos linha preta
aos batentes e ficávamos escondidos a bater às portas até irritar o vizinho.
Colava-mos moedas ao chão para nos rirmos ao longe das pessoas que não
conseguiam apanhá-las. Porta-moedas vazios atirados ao chão, com uma linha que
puxava-mos ao ser apanhados. Enfim, eram partidas inofensivas, mas que serviam
para nos fazer rir dos incautos. De tudo o que compunha as festas de Carnaval,
aquilo que eu mais gostava era do cortejo dos Fenianos Portuenses. Os carros
alegóricos, coloridos e artisticamente decoradas, sempre com uma intenção
subtil de sátira ao governo, criticando por entrelinhas a situação em que se
vivia na país, sempre contornando a policia politica e a atenção da censura. A
maior parte destes carros, eram promovidos por empresas que aproveitavam para
fazer publicidade aos seus produtos, como a pasta medicinal Couto.
Componentes mascarados, caricaturando
grotescamente as figuras públicas, atirando montes de serpentinas e confetis coloridos.
Cabeçudos, fantoches e fanfarras de fardas coloridas, bandas de música e Zés
Pereiras alegravam as ruas por onde passavam. No dia do corso, minha avó
levava-nos sempre para o mesmo local, sentávamo-nos no muro da igreja de
Fardelos na esquina de Sá da Bandeira com a rua Guedes de Azevedo, o cortejo
passava em direcção ao largo do Bonjardim, Gonçalo Cristóvão, descia Camões
terminando na Trindade junto á sede do Clube dos Fenianos. O dia do cortejo era
um dia diferente e mesmo o comércio, fechava para ver passar pelas ruas a festa
do Entrudo.
Cheguei a assistir na cidade a outros
cortejos, como o do circo onde estrelava a trapezista Pinita Del’Ouro, que se
exibia no Pavilhão do Palácio de Cristal, no Circo “Arraiola Paramés”. Este
desfile era monumental pelos animais que trazia para a rua, elefantes, cavalos
e jaulas de tigres e leões puxados por tractores. Artistas de circo com suas
vestes coloridas, desde malabaristas, acrobatas, ilusionistas, etc., exibiam-se
em plena rua com suas artes e habilidades, atraindo a criançada.
Conto-me meu pai, que já em 1934, tinha
visto algo parecido com o desfile de animais da selva e carros alegóricos
dedicados à História da Expansão Colonial Portuguesa, quando foi o final dessa
Exposição organizada pelo Estado, era como se o império desfilasse, mostrando
momentos da história de Portugal, povos de terras distantes, neste país que
tinha como principal fundamento a trilogia: “Deus, Pátria e Família”. Esta
exposição teve lugar nos jardins do palácio de Cristal, onde para o efeito
chegou a ser implantada uma estátua ao espírito colonial português. Esta
estátua que esteve desmontada muitos anos nas oficinas da câmara, acabou por
ser reconstruída e de novo implantada mas desta vez, na praça do Império, ao
fundo da Av. Marechal Gomes da Costa, por ordem da Câmara presidida por Paulo
Valada.
continua
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